segunda-feira, 13 de junho de 2011

Promessas de um mundo novo: a espontaneidade em ação






No filme “Promessas de um Mundo Novo”, observamos um movimento interessante de filmagem e documentação de um processo secular que vêm se arrastando no Oriente Médio: o embate entre Israelenses e Palestinos. De um modo bem resumido, tal disputa trata-se da dominação da terra de Jerusalém, um território considerado sagrado por esses dois grupos religiosos, sendo tal disputa intensificada com a criação do Estado de Israel e a migração forçada de vários palestino da atual região do estado do Estado para as regiões periféricas. Assim, apenas judeus têm o direito de entrar no território e os palestinos apenas em casos especiais, o que não ocorre com a grande maioria do povo.



O que é curioso de se observar no documentário, porém é o diferencial de buscar entender essa “richa” étnica através do ponto de vista das crianças. Em muitos momentos observamos um discurso pronto, preparado aos moldes dos mais velhos, em que as crianças não apresentam um discurso crítico, mas repetitivo do que os adultos pensam sobre o seu “inimigo étnico”. Não é raro encontrarmos relatos das crianças palestinas de que a terra de seus antecessores foi roubada pelos judeus e, portanto, Jerusalém os pertence. Da mesma forma, os israelenses afirmam que a terra prometida foi roubada deles há muito tempo e que, portanto, esta seria deles por direito.
Tais discursos se tornam repetidos, perpetuados e multiplicados a partir do momento em que tais grupos se constroem e se estabelecem de forma separada um do outro. Porém, no momento em que as crianças israelenses e palestinas se encontram, tais discursos se diluem, se desconstroem na formação dessas relações. A cópia do discurso dos adultos não se justifica nesses encontros e, logo, essas crianças buscam novos meios para se adaptar a essas novas situações. É aí que podemos fazer relações com a teoria de Moreno sobre o Psicodrama.



Na Teoria Geral da Espontaneidade proposta pelo mesmo autor, podemos entender a idéia de espontaneidade não como uma característica individual que as pessoas apresentam em quantidade, ou em maior ou menor grau. De um modo geral, a espontaneidade é aqui entendida como uma adaptação a algo ou algum momento que não é esperado pelos indivíduos participantes de uma determinada situação.



Há um momento em especial no documentário que ilustra muito bem como a espontaneidade se manifesta: uma criança israelense, que vive num bairro que mistura israelenses e palestinos que raramente se falam ou se encontram, é apresentada a uma criança de seu bairro ao qual nunca havia conversado antes. Nesse momento, as duas começam fazer uma competição de arrotos. É assim que observamos a manifestação da espontaneidade: o novo foi apresentado para essas crianças, por intermédio da equipe do documentário, e manifestou-se um novo momento de adaptação a elas.



É nesse momento que observamos também a queda dos discursos prontos e repetitivos dos adultos, além da queda dos papeis sociais impostos a elas. É interessante de se observar nesse processo de formação de papéis como eles são enrijecidos, consolidados e muito difíceis de serem mudados. É aí que também podemos observar outra idéia de Moreno, que nos lembra que na formação dos papéis sociais não existe aquele que é mais livre ou menos livre, pois qualquer papel social apresenta seu grau de rigidez e consolidação. Um hippie, por exemplo, pode apresentar tanta rigidez em suas atitudes e comportamentos quanto um engravatado. No momento em que a espontaneidade surge, porém, tais papéis podem se tornar mais flexíveis e fazer os indivíduos repensarem suas posições.



No desfecho do filme, onde os gêmeos judeus se encontram com as crianças palestinas, ocorre justamente esse momento: elas se divertem e brincam por longas horas, mas no final uma das crianças palestinas chora, pois criou novas amizades, mas eles irão esquecê-los e todo o esforço feito para que se encontrassem será em vão. Os papéis sociais se desfazem no momento em que a espontaneidade surge. Porém, o que observamos é o retorno deles no momento em que as crianças se separam. Esse retorno, mesmo que por breves momentos, volta de forma modificada.
Há um momento a ser destacado nos extras do filme (e que não foram exibidos na sala de aula) que é um breve encontro da equipe do documentário se com as crianças (que agora não são mais) cerca de cinco anos depois das filmagens. A criança palestina que chora estava correta: os gêmeos os esqueceram (um deles, inclusive, virou soldado de combate contra os palestinos), os discursos são os mesmo de quando crianças e temos a sensação de que os esforços realmente foram em vão. Mas por um breve momento, pelo menos, elas puderam refletir sobre suas atitudes e refazer as suas posições e colocações diante daquilo que é considerado diferente.



Assim é a espontaneidade: pode gerar mudanças, como também pode não gerar, já que suas variáveis são difíceis de prever. Mas o que é importante de se destacar é que algo de novo acontece nesses encontros.

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